A Física dos Relógios
A medida de tempo como conhecemos hoje, intervalos idênticos de segundos, minutos e horas, nem sempre foi tão bem estabelecida. Na antiguidade, as pessoas não tinham essa consciência de tempo, o ritmo de vida era mais lento. Geralmente o que definia a passagem do tempo era o movimento do Sol, as estações do ano e as comemorações religiosas [1]. Os primeiros registros de instrumentos para a medida de tempo datam de 1500 a.C. É nessa época que surge o relógio de Sol, o chamado Gnômon, que se baseia na projeção da sombra de uma haste sobre um mostrador [2,3]. Outro instrumento muito conhecido é a ampulheta, que surgiu por volta do século VII d.C. Nessa mesma época, também era utilizado o relógio de vela, que marcava o tempo pela queima de uma vela com marcações graduadas [2]. Esses instrumentos citados não eram tão precisos, muitas variações podiam ocorrer. Assim, era possível ter apenas uma ideia da passagem de um período durante o dia [2]. É por volta do século XIII que surgem os primeiros relógios mecânicos, que inicialmente não tinham ponteiros, mas faziam um sino badalar a cada certo intervalo de tempo [1]. Esses relógios funcionam com engrenagens movidas por uma massa suspensa e é daí que vem sua energia. Em seu mecanismo é necessário um escapamento, uma peça que controla o ritmo do movimento das engrenagens. Para isso, nos primeiros relógios eram utilizados o chamado Foliot, ou Verge, que era uma barra com um peso em cada extremidade e que descrevia um movimento aproximadamente regular (um exemplo disso pode ser visto em [5]) [3-5]. Mas os relógios mecânicos não eram muito precisos, eles adiantavam ou atrasavam cerca de 15 minutos por dia [6]. Foram, então, os estudos de Galileu Galilei sobre os pêndulos que permitiram um avanço nos relógios mecânicos. Galileu observou que, para pequenas amplitudes, o período de oscilação de um pêndulo não depende de sua massa, mas apenas do comprimento do fio. O pêndulo permitiria então uma excelente regularidade para serem utilizados nos relógios [3,6]. Quem de fato substituiu o escapamento Foliot por um pêndulo foi Christiaan Huygens e o ganho de precisão foi enorme. A defasagem passou a ser apenas de 10 a 15 segundos por dia [3,6]. Passemos agora para os relógios modernos, que estão presentes em celulares, computadores e entre outros aparelhos eletrônicos. Como será que eles funcionam? O efeito piezoelétrico, descoberto em 1880 pelos irmãos Pierre e Paul-Jacques Curie, diz que quando um cristal piezoelétrico (quartzo, por exemplo) é submetido a um estresse mecânico, uma diferença de potencial surge em suas superfícies opostas [7]. Mais precisamente: um cristal piezoelétrico tem uma estrutura assimétrica, mas com carga neutra e os vetores de momento de dipolo elétrico nele se cancelam. Assim, se uma deformação é sofrida por esse cristal, os dipolos deixam de se cancelar. É então que surge a diferença de potencial [7]. Os relógios que usam esses cristais usufruem do efeito piezoelétrico reverso, ou seja, se uma diferença de potencial é aplicada, o cristal passa a vibrar. Assim, o tempo pode ser medido pela frequência de vibração desse cristal, que varia entre 30 e 100 kHz e é interpretada por um circuito elétrico. A precisão dessa categoria de relógio é muito boa, com atraso de 1 milissegundo por dia [7,8]. A partir de meados do século passado, havia a necessidade de uma precisão ainda maior na medida do tempo. Os satélites de GPS (Sistema de Posicionamento Global) tinham que ser muito acurados e as telecomunicações exigiam uma boa definição de tempo e frequência, e os relógios de cristal de quartzo podiam ter variações com a temperatura e por suas características químicas. Com essas motivações e problemáticas, são desenvolvidos os primeiros relógios atômicos [8,9]. Quando uma radiação eletromagnética é incidida sobre elétrons de um átomo qualquer, eles absorvem parte da radiação e saltam de um nível de energia para o outro, ficando em um estado excitado. Após certo tempo, o elétron tende a emitir essa radiação e voltar ao seu estado fundamental. Este processo é chamado de período ou ciclo de radiação [8,9]. Com isso é possível ter uma definição extremamente precisa de tempo. No Sistema Internacional de Unidades, um segundo é definido como: 9.192.631.770 períodos de radiação, correspondentes à transição eletrônica entre dois níveis de energia específicos do Césio 133, em repouso e à temperatura de 0 Kelvin [8,9]. A precisão dos melhores relógios atômicos hoje é da ordem de 10-16 s, ou seja, uma defasagem de 1 segundo em 100 milhões de anos [8]. A precisão é tamanha que nos é inconcebível imaginá-la. Mas sem esse detalhe talvez a ciência e a tecnologia não tivessem o avanço que têm hoje. Autor: Cristhian Gean Batista Guimarães. Referências: [1] DOMINGUES, Joelza. O tempo na Idade Média e a invenção do relógio. Ensinar História, 2010. Disponível em: <https://ensinarhistoria.com.br/tempo-na-idade-media-invencao-do-relogio/>. Acesso em: 19 de set. de 2021. [2] BERGAMINI, Cristiane. Para conseguir contar o tempo, foi uma questão de tempo. ComCiência, 2018. Disponível em: <https://www.comciencia.br/para-conseguir-contar-o-tempo-foi-uma-questao[-de-tempo/>. Acesso em: 19 de set. de 2021. [3] MAIA, Flávio. Robert Hook, Christiaan Huygens e a invenção da espiral. Relógios Mecânicos, 2016. Disponível em: <https://relogiosmecanicos.com.br/curiosidades/robert-hook-christiaan-huygens-e-a-invencao-da-espiral/>. Acesso em: 20 de set. de 2021. [4] How Tower Clocks Work. Trevor Murphy YouTube Channel. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=Dr5XYle5PMc&ab_channel=TrevorMurphy>. Acesso em: 20 de set. de 2021. [5] Brian Law’s woodenclocks – Clock 16 – Verge and Foliot. Brian Law YouTube Channel. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=0P5hQpLrm-I&ab_channel=BrianLaw>. Acesso em: 20 de set. de 2021. [6] O relógio de pêndulo. Museu de Astronomia e Ciências Afins. Disponível em: <http://site.mast.br/exposicoes_hotsites/exposicao_temporaria_faz_tempo/relogio_pendulo.html>. Acesso em: 20 de set. de 2021. [7] WOODFORD, Chris. Piezoelectricity. ExplainThatStuff!, 2020. Disponível em: <https://www.explainthatstuff.com/piezoelectricity.html>. Acesso em: 20 de set. de 2021. [8] ONODY, Roberto. Do Pêndulo ao Relógio Nuclear. Instituto de Física de São Carlos, 2021. Disponível em: <https://www2.ifsc.usp.br/portal-ifsc/do-pendulo-ao-relogio-nuclear/>. Acesso em: 20 de set. de 2021. [9] Relógios Atômicos e História do Tempo | Primata Falante. Canal no YouTube Primata Falante. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=wq3fjMQxr2A&ab_channel=PrimataFalante>. Acesso em: 20 de set. de 2021.
Parabéns Cristhian! Excelente!!! Ótima explicação