
Paradoxo do Gato de Schrödinger
Durante o início do século XX, a física quântica estava em seus primórdios, e ainda não era amplamente aceita nem compreendida como é hoje. Nesse período, surgiu na escola de Copenhague, capital da Dinamarca, a teoria da superposição de estados, que sugere que partículas muito pequenas, como os elétrons, podem ocupar dois ou mais estados simultaneamente. A medição na física quântica é delicada, pois é quando surgem conceitos como indeterminação, colapso da função de onda e não-localidade. Conforme a equação de Schrödinger, antes que medições sejam realizadas, a função de onda evolui de forma contínua e determinista, de modo que a mecânica quântica se assemelha a uma teoria de campo bastante comum [2, 3].
Em 1935, o físico teórico Erwin Schrödinger, já inserido entre outros estudiosos da física quântica, propôs um experimento mental com o intuito de refutar a interpretação de Copenhague da mecânica quântica, pois a considerava ridícula e resolveu criar um cenário ainda mais absurdo para ilustrar seu ponto: o paradoxo do gato [1, 2]. O experimento funciona da seguinte forma: um gato é colocado dentro de uma caixa fechada, que contém em seu interior um contador Geiger acoplado a uma pequena quantidade de substância radioativa, passível de decair em até uma hora. Se ocorrer decaimento, o contador dispara, aciona um martelo e quebra um frasco de cianeto, matando o gato; se não ocorrer, o frasco permanece intacto e o gato continua vivo. Enquanto a caixa permanece fechada, não há como saber qual dos dois eventos ocorreu, de modo que a função de onda do sistema pode ser descrita como uma combinação linear, ou seja, o estado pode ser representado como a soma de múltiplos de outros estados, contendo partes iguais de “gato vivo” e “gato morto”. Só no instante em que se faz uma medição (por exemplo, espiando por um furo na caixa) o sistema é definido para um dos dois estados: vivo ou morto. E, ironicamente, quem descobre a situação do gato torna-se responsável por seu destino [2].
Como o próprio nome indica, trata-se de um experimento mental, isto é, não é realizado na prática, de modo a preservar a integridade de qualquer gatinho inocente. O objetivo de Schrödinger era justamente expor o caráter absurdo da interpretação de Copenhague: ele queria demonstrar que não fazia sentido aplicar superposição quântica a objetos macroscópicos. No entanto, o paradoxo acabou servindo como uma poderosa metáfora para explicar o funcionamento da mecânica quântica. De fato, parece inconcebível que um corpo de grande porte possa estar em uma combinação linear de dois estados tão distintos; já no mundo microscópico, um elétron pode estar em superposição de spin “up” e “down”, mas o gato não pode estar simultaneamente vivo e morto. Para reconciliar esse absurdo, defende-se que, ao disparar, o contador Geiger realiza a “medição” no sentido estatístico da interpretação, independentemente de haver ou não observação humana direta da situação do gato [1 – 3].
Assim, é possível afirmar que a medição ocorre no momento em que um sistema microscópico (regido pela mecânica quântica) interage com um sistema macroscópico (regido pela mecânica clássica), gerando um registro permanente em que o sistema maior não pode ocupar dois estados distintos simultaneamente [3, 2]. Schrödinger posicionou-se contra as ideias da escola de Copenhague e rejeitou a interpretação dominante de sua época. Embora reconhecesse o sucesso da mecânica quântica em prever inúmeros fenômenos, ele acreditava que a teoria estava incompleta e buscava uma descrição mais realista e palpável da realidade [1, 3].
Passados noventa anos desde sua proposição, o experimento mental do gato de Schrödinger continua a inspirar debates. Parte da controvérsia envolve a ideia de que a medição decorra da participação humana; Werner Heisenberg sugeriu, então, utilizar o termo evento, para desvincular a medição da simples ação do observador. As diferentes interpretações sobre as implicações do experimento seguem em discussão: na interpretação de Copenhague, o gato assume (ou “escolhe”) seu estado apenas quando observado; em outras, avalia-se o colapso objetivo ou variáveis ocultas; e há ainda a interpretação dos Muitos Mundos, em que o universo se divide em tantos ramos quantas as possibilidades, ou seja, num deles, o gato vive, no outro, morre [1, 3].
Apesar de todas as discussões e interpretações, há um fato incontestável: a superposição quântica é real. Tecnologias como a computação quântica fazem uso desse fenômeno, e, cada vez mais, sua influência estará presente em nosso cotidiano. O paradoxo do gato de Schrödinger nos leva a refletir não apenas sobre física, mas também sobre os limites da ciência e da observação, sobre como o ato de medir pode afetar o que medimos e, até que ponto somos capazes de conhecer a realidade.
Autora: Eloise Granville.
Referências:
[1] ARAÚJO, T. O gato de Schrödinger. Espaço do Conhecimento UFMG. Disponível em: https://www.ufmg.br/espacodoconhecimento/o-gato-de-schrodinger/.Acesso em: 05 maio 2025.
[2] GRIFFITHS, D. J. Mecânica quântica. 2. ed. São Paulo, SP: Pearson, 2011. E-book. Disponível em: https://plataforma.bvirtual.com.br. Acesso em: 05 maio 2025.
[3] MAZO, P. L. O Gato de Schrödinger. Instituto de Física de São Carlos. Disponível em: https://www.ifsc.usp.br/~strontium/Teaching/Material2018-2%20SFI5707%20MecanicaquanticaB/Monografia%20-%20Pedro%20-%20SchroedingerCat.pdf. Acesso em: 05 maio 2025.