A Física das Nuvens

A Física das Nuvens

  

   As nuvens começaram a se formar cerca de 3 bilhões de anos após a formação da Terra (que ocorreu há aproximadamente 4,6 bilhões de anos), tornando-se um dos fenômenos atmosféricos mais antigos observados pelos seres humanos (GALANTE, 2016). Devido à sua grande variedade de formas e tamanhos, as nuvens sempre exerceram uma forte influência sobre a imaginação humana. Gavin Pretor-Pinney, em seu livro The Cloudspotter’s Guide (2006), enfatiza que “o homem costuma atribuir às nuvens certa carga dramática”. Essa percepção do autor ilustra como a natureza enigmática das nuvens influenciou a cultura humana ao longo do tempo (DUARTE, 2009). Na mitologia grega, por exemplo, as nuvens eram associadas à morada de Zeus, o deus dos céus e das tempestades, assim como a outros deuses do panteão grego (CAETANO, 2017).

   Foi somente a partir do século XIX que a ciência começou a desvendar os mistérios sobre as nuvens. Neste período, os cientistas identificaram as camadas da atmosfera terrestre, a saber: troposfera, estratosfera, mesosfera e termosfera. Praticamente todos os fenômenos relevantes para a meteorologia e a climatologia ocorrem na primeira camada, a troposfera, que é a mais baixa da atmosfera terrestre (DUARTE, 2009). Estendendo-se por aproximadamente 15 km acima da crosta terrestre, a troposfera contém 80% da massa atmosférica e é a região onde se formam as nuvens (ECHER, 2006).

   Segundo Rachel I. Albrecht, meteorologista da USP (Universidade de São Paulo), as nuvens se formam quando o vapor d’água na atmosfera se condensa em gotículas de água ou cristais de gelo. Para que essa condensação ocorra, o vapor precisa se agrupar com pequenas partículas presentes no ar, conhecidos como núcleos de condensação, que incluem desde poeira, fuligem a restos de plantas e microrganismos. Esses núcleos são responsáveis por tornar as nuvens visíveis (CANAL USP, 2017).

   A visibilidade das nuvens também está relacionada à forma como elas interagem com a luz solar. Devido à sua capacidade de refletir a luz em várias direções, as nuvens geralmente aparecem brancas no céu. No entanto, em condições diferentes, como em dias nublados ou durante tempestades, elas podem adquirir tonalidades que variam de cinza claro a preto. Esse fenômeno ocorre porque as nuvens podem se tornar bastante espessas e densas. Quando isso acontece, a luz do Sol tem dificuldade para atravessá-las completamente, tornando sua aparência mais escura. Além disso, o ângulo da luz solar e a posição do Sol no céu influenciam as cores das nuvens. Por exemplo, durante o pôr do sol, as nuvens podem apresentar tons alaranjados e vermelhos devido à dispersão de Rayleigh, que espalha a luz em comprimentos de onda mais longos (CANAL USP, 2017).           

   Essas variações na cor e na densidade das nuvens são fatores importantes que permitem classificá-las em alguns grupos. De acordo com a Organização Meteorológica Mundial (OMM), as nuvens são subdivididas em gêneros, espécies e variedades. Alguns grupos incluem Cirrus, Cirrocumulos, Altocumulos e Nimbostratus — cada um com diferenças em sua composição, coloração, brilho, estrutura e densidade. Além disso, as nuvens também são categorizadas com base em sua altitude, podendo ser altas (acima de 6000 m), médias (entre 2000 e 6000 m) e baixas (até 2000 m). Vale notar que a altura dessas formações atmosféricas pode variar de acordo com a localização geográfica e a estação do ano (DUARTE, 2009).     

   Apesar de estarem em uma altura elevada, as nuvens são significativamente afetadas pela emissão de poluentes na atmosfera. Poluentes como partículas de sulfato e nitrato alteram a formação e as propriedades das nuvens, comprometendo sua capacidade de precipitar água. Isso contribui para a redução da quantidade e da distribuição de chuvas e nevadas, afetando diretamente o equilíbrio hídrico e impactando o clima local e regional (CAMPOS, 2014).

   A influência dessas impurezas na composição das nuvens tem despertado um crescente interesse no estudo dessas formações, especialmente por corroborarem na desregulação da temperatura global. Como destaca Carl Sagan em seu livro Bilhões e Bilhões, as nuvens atuam como cobertores, refletindo parte da radiação solar de volta ao espaço e reduzindo a quantidade de luz que chega à superfície da Terra (SAGAN, 2008). Sem as nuvens, nosso planeta seria semelhante à Lua, com temperaturas extremas que variam de 116 °C durante o dia e -173 °C à noite (CAMPOS, 2014).

   Dubai, Emirados dos Árabes Unidos, uma região de clima árido, tem explorado o uso de tecnologias para criar nuvens artificiais e estimular a chuva [referências]. A técnica mais conhecida é a semeadura de nuvens, que envolve o lançamento de produtos químicos como iodeto de prata ou sais de potássio nas nuvens para aumentar a condensação e estimular a precipitação. Recentemente, eles têm testado o uso de drones que disparam cargas elétricas nas nuvens, visando influenciar o comportamento das gotículas de água. No entanto, que avancemos tecnologicamente mesmo com avanços tecnológicos, devemos lembrar que há limites naturais e consequências que precisamos entender e respeitar para garantir um futuro sustentável. Afinal, como afirmou Richard Feynman, “A natureza não pode ser enganada” (ROBBINS, 2015), e cabe a nós aprender suas leis para preservar o nosso futuro.

                                                               Autora: Cassandra Trentin.

REFERÊNCIAS

GALANTE, DOUGLAS; et al. Astrobiologia uma Ciência Emergente.  São Paulo : Tikinet Edição : IAG/USP, 2016.

CAETANO, A.S; MOREIRA, A. Sociedade e Mito na Tragédia Grega. Alétheia Revista de Estudos sobre Antiguidade e Medievo, v. 9, n. 1, 2014.

CANAL USP.  Como se formam as nuvens?. Youtube, jun. 2017. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=Em74HC2mIbM

CAMPOS, E.J.D. O papel do oceano nas mudanças climáticas globais. Revista USP, São Paulo, n. 103, p. 55-66, 2014.

DUARTE, B.M. Caracterização da Estrutura Microfísica das Nuvens sobre Diferentes Ecossistemas na América do Sul Usando dados do MODIS.  Monografia, Curso de Graduação em Meteorologia. Rio de Janeiro, p. 1-10, jul. 2009.

ECHER, M. P. de S., Martins, F. R.; Pereira, E. B; et al. A importância dos dados de cobertura de nuvens e de sua variabilidade: metodologias para aquisição de dados. Revista Brasileira De Ensino De Física, Revista Brasileira De Ensino De Física,v.3, p. 341–352, 2006.

ROBBINS, J. et al. Os melhores textos de Richard Feynman. São Paulo: Blucher, 2015.

SAGAN, C. Bilhões e Bilhões. 1ª ed. São Paulo: Companhia de Letras, 2008.

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