Manfredo Perdigão do Carmo (1928-2018) – o pai da Geometria Diferencial no Brasil

Manfredo Perdigão do Carmo (1928-2018) – o pai da Geometria Diferencial no Brasil


   Manfredo Perdigão do Carmo nasceu em Maceió, Alagoas, em 15 de agosto de 1928, em um momento em que a Matemática brasileira ainda não estava consolidada em termos de pesquisa e ensino. A formação oficial de profissionais nessa área era escassa e a Matemática avançada em termos de nível superior era limitada às escolas de engenharia. O maceioense completou o ensino básico (primário e secundário) em sua cidade natal e, nesse período, foi aluno, juntamente a Elon L. Lima, do admirável professor Benedito de Morais, o qual o cientista se referia com tanto entusiasmo e carinho, mesmo depois de anos. Como relatado em uma entrevista de Manfredo a Fernando Corá [1], em 2009, o interesse do cientista pela Matemática foi devido a um curso particular ministrado pelo professor Benedito nos anos finais do ensino básico [1, 2, 3, 4].

   Ao completar o ensino secundário, Manfredo decidiu se mudar para Recife, a capital intelectual do Nordeste, porque Maceió, por ser uma cidade pequena, possuía apenas ensino superior em Direito. O cientista, dessa forma, em 1947, iniciou Engenharia Civil na Escola de Engenharia de Recife. Durante as férias universitárias, Manfredo retornava a Maceió e, nesses retornos, reunia-se com seu amigo de infância, Elon Lima, para discutirem Matemática. Em 1951, Manfredo se formou em Engenharia Civil, retornou a Maceió e, durante um curto período de tempo, atuou na área, mas abandonou a carreira quando se tornou professor assistente do recém fundado Instituto de Física e Matemática da Universidade de Recife, atual UFPE [1, 2].

   O interesse por seguir na área de Matemática como carreira veio com a participação no 1° Colóquio Brasileiro de Matemática, em 1957, pois, nesse evento, o cientista percebeu que a Matemática estava sendo profissionalizada no país. Além disso, no colóquio, Manfredo teve notícias do seu velho amigo, Elon, o qual estava finalizando o doutorado em Chicago e, por meio de cartas, retomou o contato com o cientista. Esse contato foi fundamental para Manfredo adentrar na carreira matemática, pois Elon o incentivou a iniciar um estágio no Instituto de Matemática Pura e Aplicada (IMPA), no Rio de Janeiro [1, 5].

   Nesse estágio, o interesse por Geometria Diferencial se consolidou e, em 1960, Manfredo foi para Califórnia, na Universidade de Berkeley, para realizar o doutorado, sob orientação de Shiing- Shen Chern, considerado o pai da Geometria Diferencial mundial. Após a conclusão do doutorado, o alagoense retornou ao Brasil com um sonho: de criar uma universidade modelo brasileira para a reforma do ensino universitário e, assim, em 1965, adentrou como professor na Universidade de Brasília, com seu companheiro de pesquisa, Elon. No entanto, o sonho do matemático não foi realizado devido à ditadura militar no país e à falta de autonomia das universidades nesse período [1, 4].

   Em 1966, Manfredo tornou-se pesquisador do IMPA e, ainda nesse ano, contribuiu no desenvolvimento de um programa de pós-graduação na Universidade Federal do Ceará e retornou aos Estados Unidos para realizar um pós-doutorado com o auxílio da bolsa Guggenheim, “para aqueles que já demonstraram capacidade excepcional para o conhecimento produtivo ou capacidade criativa excepcional nas artes” [6]. Nesse período, o matemático desenvolveu um trabalho sobre superfícies mínimas, em colaboração com S.S Chern, o qual despertou seu interesse por essa subárea [1, 2, 7]. 

   Em 1969, o cientista retorna ao Brasil e contribui fortemente para a consolidação da área de Geometria Diferencial como linha de pesquisa no país. Justamente por esse motivo, o geômetra é conhecido como o pai da Geometria Diferencial no Brasil. Além disso, entre 1971 e 1973, atuou como diretor da Sociedade Brasileira de Matemática (SBM). Manfredo do Carmo, ademais, foi um grande incentivador da produção de literatura matemática brasileira. O clássico livro escrito pelo cientista, Geometria Diferencial de Curvas e Superfícies, foi traduzido para o inglês, espanhol, alemão, russo, grego e chinês e é utilizado por diversas universidades estrangeiras [2, 3].  

   Em 30 de abril de 2018, o geômetra morreu, aos 89 anos. Todos os impactos realizados na pesquisa e no ensino de Matemática no Brasil são evidentes até os dias de hoje e o cientista é lembrado com carinho e admiração por seus colegas e amigos [5]. 

“Lang sempre foi uma pessoa muito incisiva e, assim que acabou de me conhecer, ele disse: ‘você tem cinco minutos para dizer o que você fez na sua tese. Se você não conseguir é porque não fez grande coisa’. Eu disse: ‘está bem, eu não desgosto de desafios, eu vou dizer em três [minutos]!’” – Relato de Manfredo P. do Carmo em entrevista a Fernando Codá (2009) ao conhecer o matemático Serge Lang, em Nova York [1].  

Autora: Rieli Tainá Gomes dos Santos.

Referências: 

[1] INSTITUTO DE MATEMÁTICA PURA E APLICADA. Entrevistas com Eméritos I – Manfredo do Carmo, 17 maio 2017. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=vO11I78BNGA>. Acesso em: 29 jan. 2022.

[2] QUEIROZ, A. J. M. DE. O Percurso Profissional de Manfredo Perdigão do Carmo e a Geometria Diferencial no Brasil. Boletim Cearense de Educação e História da Matemática, v. 7, n. 20, p. 266–276, 2020.

[3] O matemático que deu profundidade à superfície. revista piauí, [s.d.]. Disponível em: <https://piaui.folha.uol.com.br/o-matematico-que-deu-profundidade-superficie/>. Acesso em: 6 fev. 2022.

[4] DA SILVA, R. M.; DE QUEIROZ CHAVES, R.; MARIA MACHADO DE CARVALHO, T. Entrevista com o Prof. Manfredo Perdigão do Carmo. NEXUS Mathematicae, [S. l.], v. 3, 2020. Disponível em: https://www.revistas.ufg.br/nexus/article/view/64660. Acesso em: 2 fev. 2022.

[5] Matemático Manfredo do Carmo morre aos 89 anos. Disponível em: <https://impa.br/noticias/matematico-manfredo-do-carmo-morre-aos-89-anos/>. Acesso em: 2 fev. 2022.

[6] John Simon Guggenheim Foundation | About the Fellowship. , [s.d.]. Disponível em: <https://www.gf.org/about/fellowship/>. Acesso em: 4 fev. 2022.

[7] DO CARMO, M. P. Pesquisa em geometria diferencial no Brasil. Revista Matemática Universitária, n°. 26/27, p. 1–27, jun/dez. 1999.

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