Entidades científicas e acadêmicas mostram união e força em manifestações no Congresso Nacional
A Abruem (Associação Brasileira dos Reitores das Universidades Estaduais e Municipais) foi uma das mais de 70 entidades acadêmicas e científicas brasileiras presentes e atuantes nas manifestações em defesa do orçamento para a ciência e a tecnologia realizadas no Congresso Nacional na última terça-feira (10). O movimento, que contou com a participação de mais de 50 parlamentares, entre deputados e senadores, teve como objetivos pressionar o governo a aumentar o orçamento previsto para a área para o ano de 2018 e reivindicar o descontingenciamento dos recursos desse ano para ciência, tecnologia e educação pública.
Diante dos representantes das entidades, os congressistas manifestaram apoio à recuperação orçamentária e se comprometeram a fazer articulações com outros deputados no mesmo sentido. No entanto, conforme Ildeu de Castro Moreira, presidente da SBPC (Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência), entidade que estava a frente da movimentação, a cruzada pelos recursos para ciência, tecnologia e educação deve continuar até que as verbas sejam garantidas de modo concreto. “Existem promessas de vários parlamentares, mas, de maneira nenhuma, está garantido que as nossas reivindicações vão ser atendidas. Portanto, a pressão política deve continuar”, defende.
As ações tiveram início com uma Audiência Pública, que se estendeu das 9h30 às 14h, na Comissão de Ciência e Tecnologia da Câmara. Durante os pronunciamentos, as sociedade acadêmicas e científicas procuraram demonstrar o quanto a ciência já contribuiu para a economia brasileira, evidenciando, assim, a necessidade de recuperação do orçamento 2017, aprovado pelos próprios parlamentares. “Se nada for feito, vamos abdicar da nossa capacidade de construir um país soberano”, sentenciou, durante seu pronunciamento o presidente da SBPC.
Representantes de diversas entidades científicas e acadêmicas se pronunciaram durante a Audiência e, em suas falas, aproveitaram a oportunidade para denunciar o desmonte extremo das universidades e institutos de ciência e tecnologia, tanto federais quanto estaduais. “O orçamento atual para ciência e tecnologia é menos da metade do praticado em 2005, enquanto a comunidade científica brasileira, no período, dobrou”, enfatizou em sua manifestação o presidente da Abruem, reitor Aldo Nelson Bona (Unicentro – Universidade Estadual do Centro-Oeste). Para ele, os cortes orçamentários amputam as possibilidades de desenvolvimento nacional. “Mais de 80% da ciência brasileira é feita nas universidades públicas. Não podemos deixar esse colapso geral continuar”. Bona ainda destacou que a producão científica das instituições de ensino superior estaduais e municipais, até aqui pujante, está ameaçada. “A interiorização da pesquisa é resultado do trabalhos das universidades do sistema público estadual e municipal. Porém, com o orçamento limitado dos órgãos de fomento e a escassez de recursos das próprias IES, o colapso é iminente”.
Na mesma linha, representando a Academia Brasileira de Ciência (ABC), Helena Nader alertou que os cortes quando somados à Emenda Constitucional 95/2017 – referente ao teto de gastos – delineiam um cenário de mais incertezas econômicas para o Brasil. “Eu quero saber o que vamos fazer. Nem plantar batata ou soja seremos capazes, porque para isso também precisamos de ciência. Os países determinados, de competitividade mundial, são os que investem em ciência. Estamos na contramão da economia do conhecimento. É esse o Brasil que queremos?”, questionou em sua intervenção.
Se o atual cenário se confirmar, segundo Emmanuel Zagury Tourinho, presidente da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições de Ensino Superior no Brasil (Andifes), será preciso um longo período para que o Brasil recupere a posição de destaque que ocupava alguns anos atrás no cenário mundial de ciência e tecnologia. A inovação, de acordo com o presidente da Associação Brasileira das Instituições de Pesquisa Tecnológica e Inovação (Abipti), Júlio Cesar Felix, depende do aporte financeiro do estado. “Sem o financiamento público, não tem como fazer a interligação entre ciência e inovação”, afirmou, acrescentando que a atual crise não tem precedentes e já prejudica todo o esforço anterior para o fortalecimento do Sistema Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação brasileiro.
Em resposta aos argumentos apresentados pelos representantes das entidades científicas e acadêmicas, vários deputados e senadores concordaram que ciência e tecnologia devem ser tratados como prioridade pelo governo. “Não podemos ter a mediocridade de matar o que estava, a duras penas, prosperando”, afirma a deputada Margarida Salomão, que é ex-reitora da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF). “É irracional para uma nação como a nossa cortar ¼ dos investimentos em ciência e tecnologia”, completa o deputado Henrique Fontana, lembrando que os cortes colocam no lixo bilhões de reais investidos, ao longo do anos, na área.
Já para a deputada Luciana Santos, o “conhecimento é a grande moeda que move o mundo. Temos, por isso, que respeitar a 13. nação mundial em produção científica”. Posicionamento corroborado pela deputada Luiza Erundina, para quem “estamos andando para trás. Como se quer disputar a hegemonia no mundo e falar de ciência e tecnologia com esses cortes no orçamento?”. O deputado Ivan Valente também afirmou que a situação é de desmonte: “o contigenciamento fecha portas”.
Deputados e senadores também se comprometeram a empenhar esforços para articular mais verbas para CT&I. “Nossa obrigação é fazer chegar os recursos para ciência e tecnologia”, afirma o deputado Paulo Magalhães, presidente da Comissão de Ciência, Tecnologia, Comunicação e Informática da Câmara. O deputado Francisco Rodrigues de Alencar Filho, no entanto, recomenda ceticismo com as promessas feitas e incentiva que as entidades continuem a pressionar até que medidas concretas sejam efetivadas. “Não basta gentileza. É preciso ação e compromisso”, diz.
Carta aos Parlamentares
Na sequência da Audiência, foi realizado um ato público no Salão Nobre da Câmara encerrado com a entregue a petição referente à Campanha Conhecimento sem Cortes, com mais de 83 mil assinaturas, ao presidente da Câmara, deputado Rodrigo Maia, e ao presidente em exercício do Senado, senador Cassio Cunha Lima. Nas ações do período da tarde, a Abruem foi representada pelo reitor Evandro do Nascimento Silva (Universidade Estadual de Feira de Santana – Uefs).
Nos três momentos, a “Carta aos Parlamentares” foi distribuída. O manifesto – produzido pela SBPC e assinado por mais de 150 entidades científicas brasileiras – detalha a situação crítica da área no país a partir do contingenciamento drástico das verbas em 2017 e das perspectivas assustadoras para o orçamento do próximo ano.
O documento solicita garantias para o pleno funcionamento das universidades e dos institutos de pesquisa; para a continuidade do pagamento de bolsas de estudo; para a manutenção de políticas de permanência para os estudantes nas universidades; para retomada de investimentos em ciência, em tecnologia e em pesquisa nos patamares de 2014; e para a retirada da Educação e da Saúde do teto de gastos impostos pela Emenda Constitucional 95/2017.
Requente da Audiência Pública, o deputado Celso Pansera, avalia os resultados das ações como muito positivas. “O impacto na Casa foi muito grande e começo a acreditar que nós caminhamos para resolver ou se não resolver para indicar um caminho para que o ano que vem não seja tão ruim como foi 2017 para a Ciência”, pondera.
Contingenciamento de recursos em 2017 e previsão orçamentária para 2018
O contingenciamento dos recursos para o Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicação (MCTIC), nesse ano de 207, reduziu o orçamento de custeio e investimento em ciência, tecnologia e inovação para R$ 3 bilhões, valor que representa um terço do montante destinado à área em 2013. Desse modo, a Carta aos Parlamentares destaca que a comunidade científica vem, reiteradamente, solicitando ao presidente da República a liberação de R$ 2,2 bilhões contingenciados para atender, minimamente, às necessidade do MCTIC. No entanto, do descontingenciamento global de R$ 12,8 bilhões referente ao ano de 2017, anunciado no final de setembro, apenas R$ 500 milhões foram destinados ao Ministério.
O cenário para 2018 e ainda mais catastrófico. Afinal, a previsão de recursos para o CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico), por exemplo, é suficiente para cobrir as despesas para o pagamento dos 100 mil bolsistas somente no primeiro semestre do ano. O corte de 32% nos recursos destinados à Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior) no PLOA 2018 (Projeto de Lei Orçamentária); e os recursos não-reembolsáveis do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT) para a CT&I somarão R$ 350 milhões, o equivalente a apenas 8% do montante de R$ 4,5 bilhões que serão arrecadados pelo Fundo no próximo ano, também ilustram a atual situação da ciência, tecnologia e inovação no país.
* com informações da Assessoria de Imprensa da Abruem e do Jornal da Ciência (SBPC)