
Leitura de “Medea Mina Jeje” abre programação que celebra a dramaturgia negra brasileira
Nesta sexta-feira (7), a Biblioteca Pública de Irati foi palco da leitura dramática de Medea Mina Jeje. Escrita pelo paraense Rudinei Borges, a peça destaca o ato extremo de uma mãe para livrar o filho da sina da escravidão, traçando um paralelo entre o mito grego e a história do Brasil Colônia.
Enquanto a Medeia de Eurípedes mata os próprios filhos para se vingar da infidelidade do marido Jasão, a escrava Medea sacrifica o filho Age para evitar que ele fosse mutilado e condenado à desumanização do trabalho nas minas de ouro no século XVIII.
Diretor da encenação, Ernani Sequinel destaca a qualidade do texto denso e impactante de Rudinei como um caminho para pensar nas feridas deixadas abertas pela escravidão. “Eu acho que essa conscientização é mais do que necessária para entender todas essas situações sociais que a gente vive até hoje. É algo estrutural que precisa ser revisto, revisitado, relembrado o tempo todo,” afirma.
Além de Ernani, integraram o elenco da apresentação Wilma Meira, Nelci Wolski e Cristiano Wolski. Com sonoplastia de André Stoklos, a leitura dramática foi ambientada com iluminação reduzida para evocar a escuridão das minas e permitir um espaço “de muita expressividade, de muito engajamento dos atores e de muita potência”, segundo o diretor.
Pesquisadora da obra de Rudinei Borges, Janine Zakalhuk enfatiza a capacidade do dramaturgo paraense de evidenciar vivências que costumam ser esquecidas e a sua sensibilidade para contar essas histórias. “O Rudinei nasceu e cresceu à beira da rodovia Transamazônica. Então, além da questão da cultura negra, ele traz para as suas obras muitas nuances, muitas questões sobre as populações marginalizadas, sobre as populações ribeirinhas, sobre aquelas mães que perderam os filhos para a violência nas mais diversas formas”, pontua a doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Letras da Unicentro (PPGL).
“Quando recebi o Medea Mina Jeje, eu li e fiquei meio chocado. Eu devo ter relido umas 15 vezes, em meio a lágrima, choro, andava pra lá e pra cá, lia em voz alta… foi um texto que me pegou muito porque ele é forte, pesado, e que fala não apenas da cultura negra, mas também do humano”, avalia Ernani.
Dramaturgia Negra
Promovida pela Coordenação de Cultura do Câmpus de Irati (Cocult/I) da Universidade Estadual do Centro-Oeste (Unicentro), a série de leituras dramáticas do Mês da Consciência Negra busca trazer à tona uma faceta do teatro brasileiro que continua desconhecida do grande público.
Como conta o professor Edson Santos Silva, coordenador de Cultura do Câmpus de Irati, até meados do século XX, negros só podiam interpretar figuras caricatas e estereotipadas, sendo proibidos de participar das peças ditas “sérias”. Nesses enredos, quando havia um personagem negro, quem o interpretava era um ator branco utilizando o famigerado blackface.
“Na década de 40, Abdias do Nascimento funda o Teatro Experimental do Negro exatamente para fazer com que a personagem negra em cena não fosse o grotesco, o bêbado, o violento, o bizarro. Desde então, o negro passa a ter um protagonismo muito grande no palco”, comenta o docente. Além disso, Edson pontua que os três escritos selecionados para o evento – Medea Mina Jeje, de Rudinei Borges; Récita nº 3 Figurações, de Leda Maria Martins; e Macacos, de Clayton Nascimento – integram a primeira antologia de Dramaturgia Negra publicada no Brasil, lançada recentemente em 2018.
Para a apresentação das peças em Irati, o professor destaca que se valeu de “atores e atrizes da região e pessoas apaixonadas que acreditam piamente que a cultura é capaz de fazer com que o ser humano dê um salto”, nas palavras dele. “A ideia também é que, em todas as peças, haja pelo menos uma pessoa negra dirigindo ou participando da leitura dramática”, detalha o coordenador de Cultura.
Ainda segundo Edson, a escolha de bibliotecas da cidade como locais das apresentações também não é à toa. “As pessoas precisam conhecer esses dois espaços que são fundamentais para a formação de qualquer cidadão”, frisa o coordenador de Cultura.
Promovida em parceria com a Prefeitura Municipal de Irati, a iniciativa tem o apoio da Academia de Letras, Artes e Ciências do Centro-Sul do Paraná (ALACS), da Associação Cultural Denise Stoklos, do Sebo Centenário, da Biblioteca Pública de Irati e da Biblioteca do Câmpus de Irati da Unicentro.
Todas as fotos da evento estão disponíveis no Banco de Imagens da Unicentro
Confira a programação completa do Dramaturgia Negra

Por Wyllian Correa
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