A CAPELA É DE QUEM?

A CAPELA É DE QUEM?

Summary

A discussão sobre a laicidade da capela na Unicentro

O Brasil é considerado um estado laico. Essa laicidade significa uma neutralidade nas opiniões religiosas. Deste modo, o país não pode adotar uma religião oficial, mantendo-se neutro e indiferente em relação à fé professada por seu povo, inclusive garantindo aos cidadãos brasileiros o direito de não acreditar em Deus. Embora seja o país com maior número de fiéis católicos, ele segue ainda sendo um estado laico. 

Segundo estatísticas do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), cerca de 123 milhões de brasileiros são católicos, o que representa 64,6% da população. A laicidade do Estado brasileiro é garantida desde a publicação do Decreto 119-A, de 07 de janeiro de 1890, ou seja, a partir da proclamação da república, onde foi instituída a divisão entre estado e instituições religiosas.

Uma das principais polêmicas em relação à laicidade do Estado brasileiro é o uso de símbolos religiosos, como crucifixos em repartições públicas, iniciando desde a frase “Deus seja louvado” nas cédulas do real até na existência de uma capela dentro de uma instituição estadual, fazendo com que as pessoas criem argumentos para dizer que o país é um estado laico somente na teoria. 

Dentro da Unicentro no campus Santa Cruz não é diferente, de longe observa-se em um dos corredores, um quadro que retrata a representação mais antiga de Jesus Cristo na parede, um lugar sagrado para muitos fiéis, fazendo com que a exposição desse símbolo proporcione uma interpretação equivocada de que a capela pertence somente à igreja católica. Mas seguindo os preceitos da instituição, ela não é. O diretor do campus, Ademir Juracy Fanfa Ribas, ressaltou que a capela é aberta para todos os tipos de religiões, sendo assim ecumênica.

O acadêmico de Geografia Edilson Junior, 24, é ateu e protesta, pois com uma capela dentro da universidade, não tem como dizer que a mesma possa ser considerada laica, e enfatizou que a ideia é completamente errada.

Dito isso, é fato que poucas pessoas sabem que a capela existente dentro da Unicentro não foi um espaço adaptado por recursos do estado, e sim uma doação recebida a muitos anos atrás por um padre coordenador da diocese.

Segundo o professor Osmar Ambrósio, atual vice-reitor da universidade e ex-diretor de campus da instituição, quando o professor Waldemar Feller foi diretor de campus a religiosidade mantinha-se mais presente dentro da Unicentro. Ambrósio ressaltou que mesmo não sendo restrita para o catolicismo nenhum outro grupo frequentava o local.

No mandato do professor Osmar alguns professores realizaram um pedido de retirada da capela da universidade, no entanto um movimento liderado por Zilma Haick Dalla Vecchia, juntamente com alguns funcionários, alunos e pessoas ao redor do campus, protestou em favor da permanência da sala. Assim sendo, foi decidido que o ambiente serviria para momentos de reflexão. No final do mandato do Waldemar e início do Osmar foi pintado nas paredes do lugar, um afresco, que atualmente é considerado por muitos como uma pintura dos católicos. No entanto, sempre foi ressaltado como ecumênico, inclusive os recursos utilizados foram obtidos através de”vaquinhas”. Não tendo vínculo financeiro com a Unicentro.

“A capela é um lugar independente, para todas as pessoas. Não distingue classe, cor, raça, gênero e religião. Isso daqui é para todos, acredite em Deus ou não acredite”, diz Fernando Anzolin Moss, acadêmico do 2º de economia e integrante do GOU (Grupo de Oração Universitário) da igreja católica.

A partir desses movimentos foi decidido por não retirar o espaço, a decisão foi muito influenciada por uma tentativa de suicídio, que obteve recuperação com a ajuda encontrada na capela.

No âmbito acadêmico é comum encontrar pessoas de várias religiões. No campus Santa Cruz dois grupos de diferentes crenças frequentam o lugar, um deles é o Religare, um grupo de religiosos da igreja Comunidade Cristã Zoe. Natacha Fernanda de 19 anos que está a frente de uma das células do seu grupo contou a importância da capela no âmbito acadêmico, pois é ali onde encontra refúgio nos momentos de conflito, “nós não somos católicas e nossa reunião acontece aqui” disse Natacha.

Fora da capela, no campus Cedeteg, um grupo de jovens de diversos cursos se reúnem fora das salas para falar sobre seus deuses. Um dos participantes do grupo, Renan Ratis da entidade Quetzalcoatl, enfatiza que se juntam fora da capela e das salas porque preferem estar expostos aos fenômenos naturais. Renan cita que a capela é uma lembrança histórica do cristianismo e que não tem nada contra o espaço.

Buscando acabar com a discussão em relação a laicidade da universidade, o principal passo seria um diálogo inter-religioso. O que seria um diálogo inter-religioso? Se trata de um relacionamento entre fiéis de diferentes religiões, é um relacionamento recíproco de respeito, envolvendo sempre uma compreensão e aprendizado. Ele se caracteriza pela abertura, ninguém prega a sua fé e é levado a compreender o outro. Assim sendo, a pessoa deve conhecer profundamente a tradição da sua fé, para conseguir estabelecer um diálogo com argumentos.

A compreensão da pluralidade religiosa é o primeiro passo para existir uma democracia no Brasil e uma convivência cidadã. Pois a intolerância religiosa se faz presente cada vez mais na vida de todos os cidadãos.

 

Se você gostou de ler sobre o assunto, também pode se interessar sobre outro texto que está disponível aqui na Colméia: O Céu é só uma promessa, que conta as diferenças entre ateísmo e agnosticismo, mostrando experiências bem pessoais com cada um deles. 

 

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