Não diga adeus
Acordei pela manhã, estava com mais medo do que senti em toda minha vida. Todas as emoções se voltaram para os últimos dias, a guerra parece mais perto do que nunca. Ontem, ouvi algumas explosões, hoje pela manhã mais duas. Saí de casa em busca de comida, pois já não tínhamos bastante em casa. A cidade estava horrível, as ruas desertas e os sons de sirenes ajudavam-na a ter um aspecto pós-apocalíptico. Andando um pouco, em um beco mal iluminado vi uma pequena menina sozinha. Não pude deixar de notar seu rosto inchado e olhos vermelhos.
– Oi garotinha, o que aconteceu? – Pergunto, sem resposta – Onde estão seus pais?
Ela aponta para algo à sua direita. “Não quero dizer adeus”, é o que ouço. E lá estava eu, mais uma vez, ao lado daqueles que perderam suas vidas em vão. Não me contive, escondi as lágrimas pois já não era mais surpresa. Ouvi um som estrondoso perto de nós. Não pensei duas vezes, puxei-a e corri como se nossas vidas dependessem disso, e dependiam. As explosões chegavam mais perto, eu já não raciocinava. Esperava estar em casa, esperava a liberdade e segurança.
A menina ao meu lado, de quem pouco sabia, era forte. Agora, o rosto dela já não mostrava tristeza, mas medo. Não me imaginava naquela situação, meus pais estavam em casa e, por mais que sempre estivessem em ameaça, sabia que estavam seguros. Eu me culparia pelo resto da minha vida se tivesse a deixado lá.
Vi tropas russas se direcionando ao sul. Aqui uma terra sem dono, uma zona zero, é também uma terra de todos. Os militares já não querem saber quem somos. Quando me dei conta, uma grande explosão aconteceu. Minha casa, pensei. Segurei a mão da pequena garota e corri. A imagem que vi já não era mais a representação de um lar, era o inferno. Ouvi gritos, os meus, os mais altos. E lá estava eu, chorando como a menininha que encontrei mais cedo. Ela não soltou minha mão por um segundo. Entre gritos e lágrimas me lembro então de sua voz: “eu não quero dizer adeus”.
Texto: Heloisa Zolinger Polak
Edição: Millena Ricardo