A violência contra mulher e algumas possíveis soluções
Summary
Programas são realizados em Guarapuava para auxiliar na prevenção
A violência contra as mulheres ainda é muito presente nos lares brasileiros, isso impacta inclusive a vida profissional das vítimas. Algumas mulheres que estão no mercado de trabalho e sofrem violência doméstica trazem para seus empregos o reflexo do que vivem em suas casas.
De acordo com uma pesquisa realizada pela Universidade Federal do Ceará em parceria com o Instituto Maria da Penha no ano de 2016, elas chegam a ficar aproximadamente 50% a menos em ocupações em relação às que não passam por situações como essa. Além disso, os salários são menores e as vítimas costumam faltar ao trabalho diversas vezes por ano devido a incapacidades provocadas pelas agressões físicas ou psicológicas.
Maria (nome fictício para preservar a identidade da fonte), 40, mãe de Emilly, 19, faz parte desta realidade e passou por situações complicadas dentro de casa.
“Meu pai sempre foi muito violento, desde quando namoravam. Ele e minha mãe tiveram um casamento arranjado. Eu vi o inferno dentro da minha casa”, conta a jovem.
Entre traições, bebidas e crises de violência, ela, a mãe e a irmã viveram em medo constante. “Nós demoramos muito para tomar uma atitude. Ele chegou em casa bêbado e nos espancou. Eu fui desmaiada para o hospital e cheguei a ter crises convulsivas”, lembrou ela. O pai passou uma noite na cadeia, voltou para a casa e a situação se repetiu. Dessa vez, uma medida protetiva foi pedida para a família.
Violência na lei
A Lei n.11.340, conhecida como Lei Maria da Penha, teve vigor em 2006 e as normas protetivas foram decididas através dela. Após a denúncia de agressão, o juiz determina seu apontamento em até 48 horas. Essa é uma forma de garantir que qualquer mulher possa usufruir de seus direitos e segurança. Essa medida pede que o agressor se afaste do lar, além de determinar o limite mínimo de distância entre ele e a vítima.
Em 2017, cerca de dez mil mulheres sofriam violência doméstica em Guarapuava. Esses dados foram recolhidos por meio de uma pesquisa realizada pela Delegacia da Mulher. A Organização Mundial da Saúde apresentava dados afirmando que uma em cada seis mulheres já sofreu com abuso. A cada cem mil, um total de 4,4% eram vítimas de homicídio praticado por seus próprios cônjuges.
A violência esteve presente na vida de Joana, 18, desde que foi concebida; “Tudo começou antes mesmo que eu tivesse nascido. Eu cresci em um cenário de horror”, afirmou. A mãe lhe contou diversas vezes pelo que passava. “Quando ele bebe fica irritado. Se alguém fala algo, apanha. Então preferimos ficar em silêncio”.
A jovem cresceu em meio a brigas, palavras ofensivas e bebidas, que ainda encontra diariamente ao chegar em casa. “Nós morávamos no interior e quando nós mudamos para a cidade, minha mãe disse que iria denunciar. Engraçado, nunca aconteceu”, relembra Joana.
A violência verbal pode estar presente nos mais variados ambientes. É um comportamento agressivo, baseado em palavras pejorativas e danosas, com intenção de humilhar ou manipular. Esse comportamento afeta significativamente a vítima e está presente na casa de Joana. “Continua sempre, ela parece nunca parar. Eu me sinto vulnerável, sou fraca por isso. Eu passo medo, fico assustada e me deprimo. Eu me fecho no quarto e choro. Sou chamada de coisas horríveis”, explica.
Diferente da família de Emilly, a de Joana não procurou ajuda e revive constantemente o trauma. “Vivemos debaixo do mesmo teto com alguém que só difama e humilha a gente. Eu tenho pânico de muitas coisas por isso. Não posso ver discussões, não posso ver ninguém sendo agressivo. Eu projeto meu pai nessas pessoas”, esclarece Joana.
Na casa de Jéssica, 24, essa situação também era frequente. “É muito triste você ver um homem bêbado chegar em casa e descontar as frustrações na esposa. Ele perdia mais da metade do salário em apostas e culpava todos que encontrava na frente”, conta. Tudo começou com empurrões, tapas, puxões de cabelo, móveis quebrados, entre outras atitudes que mostravam o lado violento do homem. “O tempo foi passando e essas agressões apenas pioraram. Ficaram mais graves, eram batidas na cabeça, socos no rosto, e isso vai se tornando difícil esconder de toda a família. Até que um dia houve ameaça de morte, sufocamento. É triste ter que falar sobre isso. Mas houve um dia que uma faca foi utilizada como defesa, esse homem tentou homicídio e um corte no braço dele o fez parar. É errado? É, mas isso foi apenas um ato para sair viva”, recorda.
Todas as mulheres que passam por situações de risco devem contar a família, amigos e responsáveis públicos o que está acontecendo.. “É medo, impotência e insegurança. Nós não podemos deixar quieto, precisamos nos unir. Hoje sou uma mulher forte, toda minha família sentiu na pele o poder patriarcal. Nós não somos obrigadas a aceitar isso” afirma Jéssica.
Não se cale
Não são poucos os casos de denúncias contra a mulher, e atualmente especialmente na indústria cinematográfica, nossos casos aparecem todos os dias. Segundo dados recolhidos pelo USA Today, em entrevista com mais de 800 mulheres envolvidas em produções cinematográficas, 94% delas já sofreram algum episódio de assédio, sendo que apenas 25% dessas mulheres procuraram algum superior ou órgão sindical para relatar o ocorrido. Evidenciando o medo vivido diariamente. O trauma causado impede que essas vítimas comentem com qualquer familiar ou amigo sobre o caso. Perder o emprego, julgamentos e represálias se tornam motivos que as fazem reverter a culpa.
Programas em Guarapuava
A secretaria de Políticas Públicas para Mulheres atua em Guarapuava há nove anos. Idealizado pela deputada Eva Schran, o órgão tem como objetivo combater e prevenir a violência contra a mulher e proporcionar às mesmas a autonomia econômica. Pensando nisso, no cenário municipal, a Secretaria desenvolve anualmente diversos projetos que incluam a mulher na sociedade e a auxiliem a reconstruir ou enxergar sua dignidade social. Para capacitar essas mulheres em situação de vulnerabilidade social, a Secretaria criou o “Ela Empreendedora”. “Elas precisam de ajuda para sair a violência, e nós conseguimos entender que para isso elas devem ter a chance de independência financeira. Com o Ela Empreendedora nós oportunizamos cursos que trabalhem suas capacitações profissionais”, explica Priscila Schran, que está a frente da secretaria.
Em conversa com entidades, grupos, coletivos e movimentos que debatiam o Plano Municipal de Políticas Públicas para Mulheres, a equipe conseguiu definir as necessidades da cidade e região, descobrindo quais as verdadeiras prioridades para 2018, que acarretam na elaboração de novas ideias como eventos e aprimoramento de programas. Em 2017, o deputado Aliel Machado, por meio de uma emenda parlamentar, disponibilizou cem mil reais para aquisição de equipamentos que foram comprados e estão sendo distribuídos na secretaria.
Proposta de melhoria
A passos lentos o Brasil está deixando de ser masculinizado. Atualmente mulheres estão entrando em ramos que antes eram considerados dignos ou possíveis de serem executados apenas por homens. Pedreiras, eletricistas, motoristas de ônibus e caminhões estão surgindo no mercado. Em meio a esse cenário surgiu a ideia de ampliar no município a Lei da Construção Civil. Essa proposta tem como objetivo oportunizar vagas de emprego para as mulheres formadas nessas profissões. Desde agosto de 2017, 10% das contratações para obras da prefeitura são destinadas a elas. Qualquer mulher em situação de risco, violência ou assédio deve procurar um órgão responsável que ofereça apoio, incentivo e luta pelo bem-estar.
Mais casos de violência contra mulher podem ser conferidos no texto sobre violência obstétrica, uma forma de violentar as mulheres no momento do pré-natal, parto ou pós-parto.
Texto: Sabrina Ferrari para o jornal Ágora, em março de 2017
Edição: Millena Ricardo, em outubro de 2022